13/06/2016

Fronteiras

Fronteiras

Com  Kurt Lewin, psicólogo social alemão (1890 -1947) aprendi  a importância da geografia de  nossas vidas. Para ele o comportamento e o desenvolvimento de uma pessoa dependem da relação desta com seu meio físico, geográfico e cultural. Portanto, para compreender ou prever um comportamento, a pessoa e seu meio precisariam ser olhados como uma constelação de fatores interdependentes, num espaço de vida relacional.

Esta compreensão me remete a pensar na infância e adolescência.

Lembro da minha infância. Minha noção de mundo quando criança era obtida através de revistas e ouvindo rádio. Morava em Jaguari, uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, com cinco mil habitantes e era muito difícil imaginar que Porto Alegre, capital do Estado, já tinha quase um milhão de habitantes. E que São Paulo, na época, já tinha mais de três milhões. Como seria isso possível? Para mim, Jaguari já era tão grande. Como poderia haver espaço para tanta gente? E olha que eu não era mal informado, estava com doze anos de idade nessa época e já pensava demais. Mas, só podia pensar o mundo com as informações as quais tinha acesso. O resto era fantasia.

Vivia em uma época, em que não havia muitas dúvidas: os adultos  nos ensinavam todas as suas certezas com muita certeza!

Algumas dessas certezas nos diziam como agir, como ser, como fazer em relação ao mundo, em relação aos outros e em relação a nós mesmos. O ensinamento severo dessas fronteiras rígidas era, na maioria das vezes, significado por eles como expressão de amor e proteção.

A rigidez das fronteiras servia como estímulo para o jovem querer sair do ambiente controlador, quer fosse através da busca de estudar  na Capital, de conseguir um  emprego, casar... ações que acenavam como possibilidade de ter mais liberdade, ampliar o espaço de movimento de vida, criar novos espaços geográficos e, consequentemente, novos espaços psicológicos.

Sair do ambiente controlador, contudo, não significava de forma alguma que as fronteiras deixassem de existir. Não se extinguiam até porque  estavam internalizadas. E porque precisávamos delas. Essas fronteiras nos davam a sensação de pertencimento à família e a outros grupos importantes, nos situavam em um determinado espaço geográfico e permitiam que frequentássemos  espaços sociais correspondentes. Significavam também que estávamos sendo cuidados.

Insatisfeitos com elas procurávamos rompê-las através de um "salto" social  educacional e/ou profissional.

Um dos aprendizados que aquele ambiente controlador nos trouxe , foi o de que deveríamos ser mais amigos de nossos filhos do que nossos pais foram. Na busca de encontrar  essa condição terminamos por nos tornar mais parceiros, do que pais de nossos filhos. Parceiros não colocam limites, não frustram, apoiam, estimulam e, parceiros mais velhos ainda protegem.

Isso tem resultado em que, as fronteiras que nos serviram de catapultas, de obstáculos a serem superados e que nos ensinaram a fazer escolhas, começassem a deixar de cumprir estas funções.

Na busca de flexibilizar, afrouxamos.

Não quero generalizar. Há pais que, mesmo correndo o risco de serem vistos como “caretas” por seus filhos, não deixam de estabelecer  fronteiras saudáveis, protetoras das relações consigo, com os outros  e com o mundo e, que são ao mesmo tempo, estimulantes.

Refiro-me a outros que, movidos pela melhor das intenções, se perderam no estabelecimento de limites.

O momento mundial é de queda de fronteiras geográficas, noção de mundo transformando-se com uma enorme celeridade, economicamente os mercados se tornando Comuns, o dinheiro começando a ser Comum e um volume de informações impossível de ser processado por uma pessoa. Em contrapartida e paradoxalmente, temos a queda das certezas e uma inundação de dúvidas, na proporção em que a quantidade de informações aumenta.

Compreendo esse trânsito de fronteiras rígidas para fronteiras difusas,  como uma  busca humana da aprendizagem de delinear  fronteiras nítidas, claras e permeáveis, nas suas macro e micro relações, de acordo com as circunstâncias. A falta de clareza nesses limites,  que nos deixa confusos e inseguros afetiva e socialmente, se expressa em todas as formas de relações sociais, das político-econômicas às familiares e amorosas.

Dado ao desejo de todos de participação como protagonista dessa construção de fronteiras claras e justas, nada mais nos resta do que investir nessa aprendizagem, a fim de que sejamos mais felizes em nossas relações no mundo.

E isso só se conquista com o exercício do diálogo, com investimento na resolução de conflitos entre posições diferentes e na negociação.

Mauro Nogueira de Oliveira
08/2008

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