10/10/2018

Wilfred R. Bion - o grupo e o processo de liderança


Wilfred Bion (1897-1979)


Psicanalista inglês, nascido na Índia, que durante algum tempo teve a coragem de discordar de Freud no tema liderança.
Freud dizia que o grupo é o reflexo de seu líder e Bion mostrou que o líder é eleito pelo grupo.
Segundo Bion, em seu livro Experiências com Grupos (1961) todo e qualquer grupo funciona, ao mesmo tempo, em dois níveis: um nível que chamou de grupo de trabalho e onde estão as tarefas a serem realizadas pelo grupo, e um outro que chamou de grupo de pressupostos básicos, onde estão as emoções do grupo. Os dois níveis ocorrem simultaneamente.
O grupo se organiza para realizar uma tarefa e nesta organização está presente a figura de um gestor, professor, coordenador, supervisor, terapeuta, etc. que é visto pelo grupo como o responsável pela realização da tarefa, por isso percebe e espera desta figura um conhecimento das etapas da tarefa e em sua capacidade de fazer com que o grupo a execute. Ao mesmo tempo, percebe e espera desta mesma figura, capacidade de compreensão, capacidade de diálogo, disponibilidade para ouvir, e outras capacidades que representam o reconhecimento das emoções.
Sempre que estes dois níveis estão satisfeitos, o grupo experimenta uma sensação de bem-estar, de realização, com um alto índice de coesão, e um forte espírito de grupo, de pertença. O grupo consegue criar um espírito de grupo, que Bion entendia da seguinte forma:
- A existência de um propósito comum;
- Reconhecimento comum dos limites de cada membro, sua posição e sua função em relação às unidade e grupos maiores;
- Distinção entre os subgrupos internos;
- Valorização dos membros individuais por suas contribuições ao grupo;
- Liberdade de locomoção dos membros individuais dentro do grupo;
- Capacidade de o grupo enfrentar descontentamentos dentro de si e de ter meios de lidar com ele.
Quando esta figura que deveria ser a responsável pela realização da tarefa é vista pelo grupo com falta de conhecimento, falta de habilidade de planejamento, pouca visão sistêmica, etc. se, satisfaz o nível emocional do grupo, este se organiza para suprir tais carências e manter a realização da tarefa e manter esta figura pois ela satisfaz o nível emocional do grupo. Isso dura um tempo não muito longo, pois sobrecarrega alguns membros do grupo na realização da tarefa.
No entanto, quando esta figura não contribui para a satisfação do nível emocional do grupo, os pressupostos básicos, em vez de contribuírem como energia para a realização da tarefa, dispersam esta energia na busca de satisfação emocional, e faz com que o grupo escolha um líder a partir do pressuposto básico mais próximo da sua cultura. Quando isso acontece, a forma que algumas figuras de autoridade encontram para manter o grupo em atividade, é o surgimento do autoritarismo que, durante algum tempo, dará resultado, mesmo que isso signifique queda na qualidade do resultado. E este autoritarismo aparece como uma resposta ao boicote que começa a acontecer no grupo.
E uma quarta situação onde o responsável pela realização da tarefa não satisfaz o nível da tarefa, nem o nível emocional do grupo traz como resultado sua exclusão do grupo por aqueles que o colocaram nesta posição.
Alguns preferem ficar com os aspectos teóricos da obra de Bion, no entanto, a mim parece que a riqueza de seu trabalho está na dinâmica grupal que conseguiu identificar. E esta dinâmica diz que o grupo precisa estar com os seus dois níveis satisfeitos e caso isso não ocorra, surgirão processos dentro do grupo indicando estar havendo uma insatisfação e esta insatisfação se refletirá na execução da tarefa.

Conectado consigo mesmo, torna-se mais fácil abraçar os desafios e aceitar as mudanças. Bion, costumava medir a maturidade de seus pacientes pela tolerância que eles demonstravam frente a incertezas. Bion costumava vir com frequência ao Brasil. O psicanalista Rubem Alves conta que, antes de uma de suas palestras, uma pessoa da plateia comentou: “Doutor, estamos muito curiosos para saber o que o senhor vai dizer”. Bion respondeu: “Eu também”, ou seja, ele vivia a incerteza com prazer e excitação.

Mauro Nogueira de Oliveira
Janeiro 2018

04/10/2018

No endereço abaixo encontramos um artigo escrito por Dorwin Cartwright e publicado na Rev. adm. empres. vol.6 no.20 São Paulo July/Sept. 1966.
O tema é por demais interessante: Como mudar as pessoas: algumas aplicações da teoria de dinâmica de grupo

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-75901966000300006

A concepção de envelhecimento com base na teoria de campo de Kurt Lewin e a dinâmica de grupos

Excelente artigo que mostra o quanto a Teoria de Campo, de Lewin, nos ajuda a olhar para as realidades que nos cercam. E a velhice é uma comum a todos.

Beleza, CMF, Soares, SM. A concepção de envelhecimento com base na teoria de campo de Kurt Lewin e a dinâmica de grupos.. Cien Saude Colet [periódico na internet] (2018/Jan). [Citado em 04/10/2018]. Está disponível em:http://www.cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/a-concepcao-de-envelhecimento-com-base-na-teoria-de-campo-de-kurt-lewin-e-a-dinamica-de-grupos/16585?id=16585&id=16585

13/08/2018

Posições e Papéis na sala de aula


                                        Posições e Papéis

                                                           Mauro Nogueira de Oliveira


A sala de aula é um riquíssimo espaço de grupalidade. Nela identificamos diversas manifestações que retratam a vida de um grupo.
Considero que um grupo existe quando ocorre simultaneamente o seguinte: pessoas; a possibilidade do contato face a face entre elas (“eu vejo todos e sou visto por todos”); num espaço comum de convivência (a sala de aula); envolvidas em uma tarefa comum (o processo ensino/aprendizagem); por um período determinado de tempo (o período de uma disciplina, do turno, etc.)
Referindo-se à estrutura grupal, Cartwright e Zander(1975) destacam que o grupo se organiza a partir de categorias tais como posições, papéis, normas e objetivos.
Na sala de aula identificam-se posições claras: professor e alunos. Em algumas existe uma outra posição que é a do líder da classe ou representante de turma.
Essas posições determinam o status de seus ocupantes. O professor tem mais status que os alunos e dentre os alunos, o líder da classe tem mais status que seus colegas e menos que o professor.
Num espaço relacional, quanto mais claras e definidas (e não rígidas) forem as fronteiras entre as posições, mais contribuirão para uma boa operação grupal. Por fronteiras entenda-se tudo o que diz respeito a regras, atribuições e limites, que norteiam a movimentação da relação no espaço.
Os papéis qualificam as posições. Referem-se à forma como essas são desempenhadas. Definem o como acontece a ocupação de espaços pelos membros do grupo, no grupo. Por exemplo: “aluno obediente”, “professor exigente”, “aluno desinteressado”, “professor camarada”, etc.
Quanto mais papéis forem desempenhados pela pessoa que ocupa uma determinada posição, maior movimentação ela terá dentro do espaço grupal. Movimentação no sentido de conectar-se, relacionar-se com outros.
E, do contrário, quanto menos papéis desempenhados, mais imagens cristalizadas e menor será a mobilidade da pessoa que ocupa a posição.
Há membros do grupo da sala de aula que circulam por todas as “tribos”, como os considerados “populares” e há os que congelam em um determinado papel (como o “mau aluno”, o “aluno nerd retraído”, o “professor bonzinho”), a tal ponto de tornarem-se previsíveis aos demais.
Normas do grupo existem para contribuir com a definição de fronteiras entre as posições. Mais importante que elas próprias é principalmente, a forma como são criadas e estabelecidas.
Se impostas de maneira autoritária, é provável que estimulem uma reação de contra-controle.
Se construídas a partir da negociação entre os membros do grupo, tendem a ser percebidas como protetoras da relação, estimulam a responsabilidade e em função disso, a probabilidade maior é de que provoquem comportamentos cooperativos. Em especial quando existe a permissão para serem avaliadas e re-avaliadas, sempre que do grupo emerja essa necessidade.
Uma dificuldade dos educadores nesse âmbito é que, em nossa cultura, fomos educados a somente seguir normas estabelecidas por outros. Os freqüentes comportamentos reativos de membros se originam comumente do desejo frustrado em participar como protagonista nas decisões.
Se não aprendemos a construir normas dialogicamente, consequentemente não nos comprometemos a respeitá-las. Aprendemos a obedecê-las. Ou até a fingir que o fazemos. Isso está mais próximo da submissão e até do cinismo, do que da cooperação e da responsabilidade.
Cada grupo tem seu objetivo, o que não necessariamente coincide com os objetivos individuais dos seus membros. É possível que o membro do grupo se inclua e assuma o objetivo grupal, apenas para poder alcançar seus objetivos individuais. Exemplo: o objetivo de um grupo que está em sala de aula é aprender os conteúdos das disciplinas; seus participantes, no entanto, podem ter outros como: aprender para satisfazer seu desejo, para ser reconhecido pelos pais e pelos outros, simplesmente estar junto com os colegas, apenas cumprir com uma exigência familiar e comunitária, etc.
Quando os objetivos grupais e individuais se complementam, a operação do grupo estará mais próxima da harmonia. Quando do contrário, esses objetivos competem, o desprazer na relação é presente e os resultados são afetados negativamente.
Esse olhar para a dimensão grupal da sala de aula, pode ser estendido para outras manifestações grupais, consideradas as suas peculiaridades: a empresa , a família, o grupo de amigos que se encontra com regularidade, o grupo que realiza atividades comunitárias e outros.

19/01/2018

Nomes, Pensamentos e Mentiras - para entender Experiências com Grupos de Bion

NOMES, PENSAMENTOS E MENTIRAS: A RELEVÂNCIA DOS ESCRITOS POSTERIORES DE BION, PARA ENTENDER EXPERIÊNCIAS COM GRUPOS

David Armstrong
(Traduzido por Mauro Nogueira de Oliveira)
 
http://www.continents.ventajas.com/bluestunningbar.gif
"Percepção psicanalítica em indivíduos e grupos" é o subtítulo de Atenção e Interpretação.  Acredito que é possível localizar neste mais recente trabalho de Bion, linhas de pensamento que complementam, modificam e ampliam as ideias apresentadas em Experiências em Grupos, e que a negligência relativa destas linhas de pensamento por praticantes em 'relações de grupo' contribui para uma atrofia teórica e metodológica auto infligida que às vezes parece cercar quem trabalha neste campo. 

BION NO TRABALHO: UMA MEMÓRIA PESSOAL
Há uns vinte e cinco anos atrás, participei do que penso que foi o último 'study group' conduzido por Bion na Inglaterra, como parte de um curso de relações de grupo que durou mais de três meses, e dirigido por Ken Rice, no Instituto Tavistock, em Londres. 
Olhando para trás, não recordo muito dos detalhes do que aconteceu e do que foi dito nessas reuniões. Retenho uma impressão visual forte da sala em que nos encontrávamos, na Rua Devonshire, com suas janelas altas e chão polido, e dos membros do grupo. Participaram um Administrador de prisão, um psicólogo de prisão, um par de homens de negócios, um jornalista, um jovem assistente social e um igualmente jovem, eu. (Na ocasião eu participava de um Projeto do Tavistock que trabalhava com pesquisa e ação, principalmente em organizações industriais.) 

Os dias estavam um pouco tórridos no Tavi. O Instituto tinha se dividido recentemente em duas facções, encabeçadas por Eric Trist e Ken Rice. Eu pertencia à facção de Eric Trist e só me foi permitido assistir o curso porque seria coordenado por Bion. Do próprio Bion, eu me lembro principalmente da pessoa: o modo dele andar na sala e se sentar, a igualdade da sua fala, o seu ar de intensa e imparcial curiosidade. 

Eu voltarei a este tema novamente. Primeiro, quero fazer um comentário sobre duas outras, parcialmente relacionadas, recordações. A primeira, e eu estava muito atento, assim como outros membros do grupo, é que Bion nunca deu a mais leve impressão de ser o autor de Experiências em Grupos. Alguns de nós tínhamos lido o livro anteriormente, com graus variados de compreensão e frustração. Fomos preparados para ver as 'suposições básicas' no trabalho e serem oferecidas evidências de nossa experiência. Ficamos tristemente desapontados e intrigados. Nada do que Bion disse parecia conectar com este aparato conceitual; considerando que nos eventos de intergrupos, coordenados por Ken Rice, Isabel Menzies, Bob Gosling, Pearl King e Pierre Turquet, durante dois fins de semana, dependência, pareamento e luta/fuga estavam em todos lugares, e eu penso genuinamente, ter encontrado. 

A preocupação de Bion estava em outro lugar. Mas onde? Nas primeiras sessões ele falou muitas vezes sobre o uso de nomes: o modo de nomear tem uma qualidade ilusória, como se fosse a resposta a uma pergunta em lugar de uma pergunta para a qual uma resposta precisa ser buscada. 

'Eu sou David Armstrong' busca identificar um limite ao redor de uma entidade que se é: para usar a linguagem de Bion, ligar uma conjunção constante com um nome é o que Bion se refere como uma hipótese de definição. Mas esta ligação também pode ser usada para restringir a pesquisa. Um limite para exploração (quem é David Armstrong?; o que é ele?; onde ele está aqui e agora?) se torna uma barreira para defender o que é 'eu' do que é 'não eu'. Um limite é fixado, o desconhecido é roubado de seu poder para perturbar. A vingança do desconhecido pode ser um curioso vazio de sentimentos, impossibilitando estabelecer contato com o grupo, ou até mesmo consigo mesmo. 

Nas últimas sessões, um tema que ocorreu periodicamente era o conhecimento e o medo de conhecimento expressados em regras, moralidades e juízos. As reuniões do grupo aconteceram na época do 'caso Profumo'.  Recordo a confusão de Bion (talvez seja uma palavra muito forte) à energia moral que isto lançou no grupo, como se nós não pudéssemos desviar o pensamento deste caso, como os casos que às vezes aparecem em conferências de relações de grupo, poderia ser entendido, adaptando uma frase de Clausewitz ou Bismarck sobre guerra e diplomacia, simplesmente como a perseguição política através de outros meios. Moralidade era a mentira inventada para esconder um pensamento. 

Nomear, saber, inventar mentiras, achar pensamentos, estes temas ocorreram periodicamente ao longo do que Bion escreveu. Para mim eles funcionam como um adubo tanto na exploração do campo grupal como do individual. Mais que isso, eu também acredito que estes dois campos provêm, na frase de Bion, uma 'visão binocular' para explorar e entender o solo do conhecimento e desconhecimento humano, sem os quais nós somos prisioneiros de nossos medos e terrores, em nossa vida pública e privada. 

O GRUPO COMO UMA ARENA PARA TRANSFORMAÇÕES
Antes de explorar este ponto, quero retornar ao que disse anteriormente sobre a qualidade ou tom das intervenções de Bion. Frequentemente em eventos de relações de grupo você está muito bem atento quando uma 'interpretação' está sendo feita pelo consultor. É como se de alguma maneira levasse a etiqueta de 'interpretação' em sua sintaxe, complexidade ou endereço. Se você é o consultor, está semelhantemente atento ao que é seu e ao que é do grupo e que os membros estão atentos que você está atento a isso. As intervenções de Bion não anunciavam as suas intenções deste modo. Era uma interpretação que ele estava oferecendo, ou uma observação, ou um comentário, ou uma opinião? Você não podia dizer. Estava mais como um elemento de uma conversação, sem ser exatamente sociável. 

Anos atrás assisti, uma ou duas vezes, o filósofo John Wisdom em 'Outras Mentes em Cambridge'.  Eram desempenhos muito estranhos. Iniciavam como uma conferência, de um modo familiar. Então havia um longo silêncio.  Wisdom contemplava um canto da sala ou a parte de trás do corredor e arrancava uma imagem ou exemplo daquele espaço, como se estivesse fisicamente presente a ele naquele momento. Ele começava a descrever isto como um elefante rosa, uma lua azul, um espírito intranquilo.  Todos suprimíamos uma risadinha. 

Wisdom era tão auto absorvido quanto muitos grandes filósofos provavelmente eram ou são. Os vínculos que ele viu e fez naquela sala eram vínculos em um espaço mental projetado na frente dele. Porque nós não habitávamos aquele espaço não podíamos fazer os vínculos, não podíamos ver os pensamentos que ele achou no ar ao redor dele e de nós.  Bion não era tão auto absorvido assim. Os vínculos que ele viu e fez eram vínculos em um espaço mental não projetado na sua frente ou no seu interior, um espaço para qual os membros do grupo e o grupo como um todo contribuíram. Mas havia a mesma sensação de estar na presença de um descobridor de pensamentos, oferecidos como alimento para pensamento. 

Talvez este estilo de funcionamento seja inimitável. Mas mesmo sendo, eu penso que contém ou exemplifica uma concepção importante sobre grupos, mais especificamente sobre a ideia do 'grupo de trabalho'. Bion às vezes é acusado de não levar o 'grupo de trabalho' a sério como, às vezes, os psicanalistas são acusados de tomar a 'realidade concebida', para poder estudar os vários estratagemas de evasão e negação. Acredito que isto está fundamentalmente errado e que no modo de funcionamento de Bion a pessoa pode descobrir um significado de um grupo de trabalho, de um certo modo que transcende qualquer simples noção de acomodação à realidade e oferece uma visão radicalmente diferente do grupo, como uma arena para transformações. 

O OBJETO DE TRANSFORMAÇÃO
Se o grupo é potencialmente uma arena para transformações, o que está sendo transformado, o que envolve o processo de transformação e o qual é o seu valor? 

O primeiro destes questionamentos: "o que está sendo transformado" é talvez o mais fácil de responder. Para Bion, a origem da transformação: a coisa-em-si (última realidade ou '0') que não pode ser conhecida exceto pelo processo de transformação, é sempre a mesma. É experiência emocional. Nos escritos posteriores, Bion é corajoso ou bastante precipitado para reivindicar que todo o pensamento humano, qualquer que seja o campo, se origina na transformação da experiência emocional. Se a pessoa pensa em uma pintura, em uma canção, em um poema, em um romance, em um pedaço de cerâmica talvez, não é difícil de conceber isto como a tentativa do artista para formular, fazer presente e comunicar "através da cor e do desenho, por sucessões de tons ou de palavras, pela forma e textura do barro" uma experiência emocional presente nela. 

É importante, para o que direi depois, que este ato de se fazer presente não é (para Bion) um ato de simples representação. Representação sugere um modelo de algo a ser representado e algo pelo qual é representado, como se o pintor confrontasse uma experiência emocional como ele confronta o seu modelo: uma paisagem, uma babá.  Fazer-se presente não é assim porque, diferente de um objeto sensual, uma experiência emocional não pode ser vista, provada, cheirada, tocada. É um evento mental: um desconhecido 'x' ou uma coisa-em-si. O único acesso que temos a isto é através das transformações que nós fazemos ou executamos disto. 

Um colega meu, Colin Evans da Universidade de Gales, chamou minha atenção recentemente para uma citação de Salman Rushdie em Os Versos Satânicos. O trabalho do poeta, Rushdie escreve, é 'nomear o inominável, apontar as fraudes, tomar partido, lançar argumentos, amoldar o mundo'. Talvez haja algo de megalomaníaco; também algo bastante misterioso e presciente. Mas a primeira frase, 'nomear o inominável', é, eu penso, uma boa descrição do que é estar envolvido em uma experiência emocional, mesmo que reconheçamos que o nome e a coisa nomeada não sejam iguais. 

Quando olho uma pintura não vejo a experiência emocional que foi a origem do trabalho de Cezanne como um artista, por exemplo. Eu tenho uma experiência emocional e isso pode me levar a dizer: 'eu nunca entendi isto antes, como um objeto reflete e leva a presença de outro'. Ao extremo, esta experiência pode me conduzir a mudar minha vida na frente de uma grande obra de arte. Eu não só entendo ou sei algo novo, eu me torno algo novo. 

Mas reivindicando que todo o pensamento humano e esforço representa uma transformação da experiência emocional, Bion vai além destes exemplos bastante óbvios. Matemática, ele dirá, é uma transformação da experiência emocional pelo idioma do número; geometria pelo idioma das coordenadas do espaço. Em algumas das suas mais recentes discussões, Bion cita o paralelo entre descobertas astronômicas e descobertas em psicanálise. 

Eu estou familiarizado com uma teoria psicanalítica da mente humana que parece com a teoria astronômica do buraco negro até onde eu posso entender formulação astronômica. Por que um psicanalista deveria inventar uma teoria para explicar um fenômeno mental e, independentemente, os astrônomos elaborarem uma teoria semelhante sobre o que eles pensam sobre um buraco negro no espaço astronômico? O que está causando o que? Esta é uma peculiaridade da mente humana que projeta isto para o espaço, ou isto é algo real no espaço do qual deriva esta ideia de espaço na própria mente? 

Esta é uma pergunta que é improdutivo tentar responder. Ou para por isto de outro modo, a resposta é provavelmente e/ou: como um quadro de minha mão mostrando um lado de minha mão, e um quadro de minha mão mostrando o outro lado de minha mão. O desejo para nomear é uma tentativa para solucionar um mistério que precisa ser vivido e explorado. E este mistério tem a ver com a conexão do pensamento das realizações humanas, em um tempo e lugar particular e através das diferentes ciências ou artes, puras e aplicadas. 

Usando minha própria linguagem e de meus colegas de investigação no Instituto Grubb, o modo de pensamento e funcionamento de Bion, exemplificados aqui, fundamentalmente poderiam ser descritos como 'sistêmicos'. Ele está interessado no modo pelo qual algo em uma cultura, um contexto, se reproduz em formas diferentes, realizações diferentes, a partir de alguma raiz comum. E junto com este interesse vai uma consciência que tem a ver com a produção e procura de vínculos: entre uma pessoa e outra, entre o indivíduo e o grupo, entre uma palavra e o que é usado para expressar, entre físico e mental, consciente e inconsciente. E examinando estes vínculos, os experimentando dentro dele na sua prática como psicanalista, Bion se achou experimentando repetidas vezes, uma resistência para unir os extremos, que ele sentia, como um ataque em sua mente. 

TRANSFORMAÇÕES E RESISTÊNCIAS
Me deixe citar, novamente das recentes discussões, uma resposta que Bion deu a um psiquiatra a que estava expressando a sua perplexidade diante de uma 'especulação imaginativa' que Bion estava oferecendo sobre o desenvolvimento da personalidade durante a vida intra-uterina: "Meu chefe cirúrgico, quando eu era um estudante médico, era Wilfred Trotter que escreveu Os Instintos do Rebanho na Paz e na Guerra. Ele chamou a atenção para algo que parece existir. Por exemplo, tome um grupo como este: Nós temos uma combinação de sabedoria que torna insignificante o pouco que cada um de nós sabe, mas por analogia nós somos como células individuais, no domínio que é limitado por nossas peles. Eu penso que há algo pelo qual esta combinação de sabedoria se faz sentir ao mesmo tempo por um grande número de pessoas. Nós gostamos de pensar que nossas ideias são nossa propriedade pessoal, mas a menos que nós possamos fazer nossa contribuição disponível para o resto do grupo não há chance de mobilizar a sabedoria coletiva do grupo que poderia conduzir para avançar no seu desenvolvimento. Há certas pessoas altamente inteligentes que não podem tolerar o bombardeio perpétuo de pensamentos, sentimentos e ideias que vêm de todos os lados, inclusive delas mesmas. Assim elas cancelam a assinatura dos jornais; retiram o número da lista de telefones, puxam as cortinas e tentam até onde possível, alcançar o tipo de situação na qual elas fiquem livres de impacto adicional. Assim a comunidade perde a contribuição que o indivíduo pode fazer e o indivíduo morre mentalmente da mesma forma que certas células na necrose do corpo." 

O corpo tem a inteligência para resistir a uma invasão de corpos estranhos como bactérias e mobiliza fagócitos para lidar com os objetos invasores. É possível que possamos nos organizar em comunidades, em instituições para se defender contra a invasão de ideias que vêm do espaço exterior, e também do espaço interno? O indivíduo tem medo de permitir a existência de imaginações especulativas até mesmo dele próprio; ele tem medo do que aconteceria se qualquer pessoa notasse estas especulações imaginativas e tentasse livrar-se de uma influência perturbadora. 

Esta resposta contém a síntese da visão altamente paradoxal de Bion de grupos e experiências em grupos. Disto eu quero tirar três implicações: Primeira, a resposta torna claro que, para Bion, indivíduo e grupo são necessários para o progresso e desenvolvimento de cada um. Não é justo que as ideias de um indivíduo, para entrar no domínio público, precisem de um grupo que possa contê-las e trabalhar com elas, sem destruir ou roubar sua vitalidade, seu poder para perturbar, destruam-se no processo. O grupo encarna uma sabedoria coletiva, uma multiplicidade de recursos, centros de consciência que podem alimentar, somar e preencher o que qualquer indivíduo tenha comunicado. (Isto é o que eu tenho em mente falando do grupo como uma arena para transformações).
Mas, segundo esta resposta também torna claro que o grupo, organizado como uma comunidade ou uma instituição, resiste às mesmas oportunidades para transformação que sua própria desenvoltura provê. Além disso, cada indivíduo toma parte nesta resistência. E Bion deixa claro que esta resistência não é só de um membro do grupo.  A resistência no grupo ressoa com a resistência do indivíduo, sob do disfarce de proteger algo sentido como pessoal e pertencente a si mesmo: minha ideia, minha experiência, meu pensamento. 

É comum em conferências de relações de grupo que o consultor ou um membro do grupo chame a atenção para o uso de 'nós', como uma representação de uma ideia do grupo como algo monolítico.  É um pouco menos comum chamar a atenção para o uso do 'eu'.  Ainda que ambos os usos, 'nós' e 'eu', frequentemente sirvam ao mesmo propósito, bloquear conhecimento adicional, fixar limites para a união, preservar um limite que é sentido como ameaça através de intromissões de alguém ou outro lugar.  Se uma ideia, uma experiência, um pensamento, um sentimento, pertence a nós ou então a mim, podemos sentir que nós ou eu está sob nosso ou meu controle.  É algo que nós ou eu possuímos, e então nós ou eu podemos desconhecer.  Mas suponha que não pertença a nós nem a mim.  Nós ou eu não sabemos o que acontecerá, para onde conduzirá, se germinará em um pássaro ou um monstro, se nos dará vida nova ou nos matará. 

É esta possibilidade que dá tal ressonância e durabilidade aos mitos de Prometheus, Fausto e Frankenstein, do Jardim do Eden e a Torre de Babel. 

Nada está protegido de pensamentos. Só mentiras estão seguras até que o pensamento venha. Ou, pondo isto nas condições de Bion, mais exatamente, os únicos pensamentos que estão seguros são os pensamentos para os quais um pensador é absolutamente essencial; e os únicos pensamentos para os quais um pensador é absolutamente essencial são as mentiras. Consequentemente o dictum feliz de Bion afirma que a suposição tácita de Descartes que pensamentos pressupõem um pensador, só é válida para a mentira. 

O que é uma mentira? Bion põe isto assim: uma mentira é uma formulação conhecida pelo iniciador como falsa, mas mantida como uma barreira contra declarações que conduziriam, caso contrário, a uma transformação psicológica ou emocional. O motim emocional contra o qual a mentira é mobilizada é uma 'mudança catastrófica': isto é, uma mudança que ameaça a psique, a experiência da pessoa e sua estima, ou, como Bion diz, 'afronta o seu sistema moral’. Tais formulações são familiares em grupos e organizações, na relação de uma pessoa com outra ou para consigo mesmo. 

Isto me conduz à terceira implicação da resposta de Bion. A fonte do paradoxo que o grupo, assim como o indivíduo, simultaneamente provê que a oportunidade para e as forças da resistência para a transformação, serão achadas na incerteza, na dúvida, no não saber, que é a definição característica da formação de um pensamento. Ou talvez seria melhor dizer, da consciência da experiência emocional que, se podemos tolerar a frustração do não saber, pode prover o solo no qual um pensamento possa aparecer. O cerne deste não saber, que paira no ar, como um pensamento, é o medo da mudança catastrófica. 

PENSAMENTOS E O GRUPO
O que tem isto a ver com entender nossas experiências cotidianas em grupos, não só em grupos de conferências de relações de grupo, mas qualquer grupo: uma sociedade, uma organização, uma família, uma tribo, uma associação voluntária? Algum tempo e algumas circunstâncias, talvez não muito. Eu penso que podemos exagerar frequentemente até que ponto o trabalho do mundo, o trabalho que todos nós fazemos, pede esforço mental contínuo, um encontro com o desconhecido. Nós podemos sobreviver com hábitos, costumes, truques inteligentes de nosso comércio, nossa inteligência nativa, contanto as circunstâncias não mudam muito, externamente ou interiormente.  Nós somos ocupados. Nós estamos tendo que ser inteligentes, adaptáveis, sabidos. Nós necessariamente não estamos tendo que pensar. 

Mas claro que as circunstâncias mudam, dentro e fora. Um ambiente amigável a nossas atividades e interesses fica não amigável. Salman Rushdie escreve um livro. Líderes novos, faces novas, ideias novas são geradas. E nós mudamos. Costumes velhos envelhecem, os hábitos da inteligência parecem puídos. 

Em um tal contexto vital, que pode surgir dentro de um único grupo ou organização, mas que também pode infectar uma sociedade inteira, todos os fenômenos que eu aludi como o paradoxo essencial da vida do grupo, significando e ressignificando para forçar nossa atenção, podem incluir o seguinte: 

Primeiro, há uma consciência de experiência emocional no grupo, por parte de seus membros, separadamente e corporativamente, que é não focado e intocável, que pode não ser possível pôr em palavras e pode se mostrar em comportamento que os psicanalistas se referem como 'acting out'. Esta experiência pode ser composta de sentimentos de excitação, expectativa, desespero, perda de controle ou vacuidade.
Um modelo para iluminar este estado, Bion sugere, é o fenômeno do nascimento: Eu suspeito que há alguma contrapartida do termo 'nascimento de uma ideia': que há alguma razão para imaginar que estão relacionadas estas experiências dolorosas que temos no processo de dar à luz a uma ideia ou para fazer uma conexão, que é uma instância de pensamento. Uma instituição, uma sociedade de seres humanos, pode estar impossibilitada de sobreviver ao nascimento de uma ideia. Nós somos, indubitavelmente, descuidados com nossa obstetrícia psicológica. Nós parecemos sentir que a coisa a fazer com uma ideia recém-nascida é dar uma beijoca. 

Muito de meu próprio e do trabalho de meus colegas no Instituto Grubb não leva a forma de funcionamento com grupos ou organizações, mas com representantes individuais, frequentemente gerentes seniores ou líderes, usando um método de consulta individual descrito por Bruce Reed como 'Análise do Papel Organizacional'. Como uma organização de pesquisa social aplicada, nossa meta particular é descrita como: identificar, interpretar e trabalhar os pontos de pressão da organização e através da análise profissional e práticas gerenciais, permitir aos clientes alcançar seus objetivos institucionais. 

Assim nós estamos profissionalmente voltados para trabalhar nessas situações onde o tipo de fenômeno que eu estou buscando descrever, é provável acontecer. 

Às vezes um cliente que nos procura aparentemente sabe exatamente qual é o problema, ou exatamente o que ele quer saber, ou exatamente o que ele quer que você faça sobre isto, que envolve frequentemente fazer algo para ou com alguém. É como se tudo o que cliente requer é que outra pessoa assuma um trabalho particular que ele ou a organização não se sente competente bastante para fazer por si próprio. O interesse dele está em empregá-lo como um técnico e explorar suas perícias. Também pode haver todos os tipos de outras motivações ou considerações.  Dada nossa meta, como um Instituto, estas situações podem precisar de ser ordenadas antes de qualquer decisão.  Um cliente que conhece exatamente o problema ou o que ele quer que você faça sobre isto não está no reino dos 'pensamentos' e provavelmente não dará boas-vindas a isto se você estiver. Ele está procurando confirmação das ideias mais prováveis que ele já sabe, ou técnicas à mão ou truques para alcançar o que ele quer alcançar. 

Como a pessoa explora a situação com o cliente, pode começar a sentir que ele está no território que eu me referi antes como o da 'mentira': quer dizer, a declaração do 'problema' é conhecida como sendo insatisfatória ou falsa, mas é assegurada porque não fazer isso provocaria algum motim na organização como um todo ou na própria percepção do cliente a respeito do seu papel. O que acontece então dependerá do juízo que o consultor faz a respeito dele ou da capacidade do cliente em confrontar e trabalhar com esta possibilidade. 

Mas um cliente também pode vir bastante incerto de qual é o real problema; que conta uma história que o deixa confuso e caótico como ele, que está sofrendo uma sensação de frustração, de turbulência dentro e fora da organização. Tal cliente, nas condições que estou usando, está anunciando que pode estar na presença do 'nascimento de uma ideia': algo esperando ser formulado no ato da exploração e interpretação entre você e ele. 

Segundo, a consciência de desfocar a experiência emocional no grupo (ou representante do grupo) é acompanhada e pode ser escondida por outros elementos que resistem a isto. Um exemplo é a afirmação de limites como barreiras, ou ao redor do indivíduo ou do grupo, pelo uso de nomear como uma defesa. Eu me referi a isto anteriormente, falando sobre os modos nos quais os pronomes 'Eu' e 'Nós' podem ser desdobrados para prevenir o reconhecimento do fato que a experiência nova é justamente uma experiência que põe em questão o significado a ser dado a estes nomes. 'Eu', 'Nós' não estiveram aqui antes. A abertura para o presente da experiência emocional aqui e agora, significa meios que estão abertos à evolução de 'Eu', 'Nós' e a relação entre eles. O uso insistente de 'Eu' / 'Nós', trai a presença do 'não-Eu', 'não Nós' que já está dentro de mim/de nós e espera nascer. 

Tal uso defensivo de nomear pode aparecer em muitas outras formas. Recentemente estávamos envolvidos em muito trabalho com escolas, em particular com grupos de cargos superiores. Escolas são organizações que enfrentam grande turbulência atualmente, dentro e fora. Esta turbulência não tem só a ver com a interferência governamental contínua e a legislação. Também há consciência de algo na sociedade que desafia e questiona sobre o significado das escolas, da educação e treinamento, ensino e aprendizagem, em nosso ambiente presente.  Em nossa experiência, muitos professores, em muitas escolas, têm a coragem para enfrentar esta turbulência, para sofrer a incerteza dentro deles e de suas instituições e trabalhar com isto. Mas há também, às vezes, a tendência de resistir muito poderosa. Isto emerge frequentemente em uma preocupação defensiva com e no uso de valores, ou na afirmação de uma certa concepção da profissão pedagógica que é projetada para circunscrever o que pode e não pode ser entretido como um pensamento. 'Valores' e 'profissão' são chamados como se eles fossem nomes cujo significado já é conhecido e determinado, em lugar de hipóteses, cujo significado aqui e agora sempre é aberto à exploração e à evolução. 

Há um vínculo entre este uso da defensiva de nomes e a mentira (no sentido técnico no qual eu tentei desdobrar isto).  Ambos são frequentemente parte, aberta ou veladamente, de uma preocupação com a moralidade: o que deve ou não deve ser, contra o que é e o que não é. 

Meu colega John Bazalgette conta uma história adorável de uma menina que foi solicitada a escrever uma pequena revisão de um livro sobre pinguins. O que ela escreveu foi: 'este livro me conta mais sobre pinguins do que eu quero saber'. É o medo de que aprender mais do que a pessoa quer saber que contribui tão poderosamente à mentira.  Atrás deste medo espreita uma convicção primitiva que as únicas notícias boas não são nenhuma notícia, ou pelo menos notícias de ontem. E atrás deste medo, sugere Bion, está a culpa persecutória de que a ideia é o combustível do pecado original. 

No último volume da sua psicanalítica autobiografia, Bion se refere à culpabilidade, pela boca de ' PA', como: Um dos fundamentos, uma das suposições básicas.... O crime (racional, lógico) e o sentimento de culpa são parceiros naturais. É uma forma pela qual a justiça, moralidade e ingenuidade intelectual pode ser dedicada por tão longo tempo para poupar tempo e energia. 

Eu não sei se usando o termo 'suposição' básica aqui, Bion pretendeu com isto as associações que cercam seu uso técnico em Experiências em Grupos. Até onde eu sei ninguém explorou esta possibilidade no contexto de relações de grupo. Se culpabilidade é uma suposição básica na mentalidade do grupo, então talvez a instituição da lei em sociedade pode ser vista como representando a resposta de um 'grupo especializado de trabalho' para lidar com as emoções associadas com a culpa. 

A MOBILIZAÇÃO DAS SUPOSIÇÕES BÁSICAS
Esta referência às suposições básicas introduz um terceiro jogo de fenômenos através dos quais, em um contexto vital, os paradoxos essenciais da força de vida de grupo chamam nossa atenção, isto é, a mobilização de atividade de suposição básica: dependência, pareamento e luta/fuga. 

Eu ainda não disse nada em detalhes sobre estas suposições. Não porque eu pense que elas não sejam importantes, mas porque eu penso que este território é muito bem explorado, particularmente em trabalhos de relações de grupo, que pode obscurecer ou pode chamar nossa atenção para longe de outros fenômenos de grupo.  Nós precisamos ir além das 'suposições básicas', se esquecer delas para poder redescobri-las e as fazer novas, se elas retêm vitalidade conceitual e relevância. 

Eu não penso que é necessariamente correto dizer que as suposições básicas são defesas de grupo. Bion as vê como inerentes à toda atividade de grupo em Experiências em Grupos. Elas correspondem a três do que ele descreveu como as quatro situações básicas para as quais as direções emocionais primárias correspondem: 'nascimento, dependência, pareamento e guerra'. Mas, na constelação que estou buscando descrever, penso que a mobilização de suposições básicas, as formas particulares que levam e as ocasiões nas quais elas se forçam na atenção da pessoa, tem uma função defensiva. Elas estão atentas, por parte do grupo, para se pôr além do encontro com o desconhecido, além do reino do pensamento, de nomes e de mentiras: achar uma solução mágica para o dilema existencial do grupo e de todos seus membros. 

O que eu penso sobre todos nós que trabalhamos com relações de grupo não é sempre muito bom ou afinado para assistir e/ou caracterizar este dilema. Porque acreditamos que as suposições básicas são onipresentes, não temos nenhum cuidado para notar quando, e considerar por que, elas obstruem nossa experiência. 

RÉ-EMOLDURANDO O 'GRUPO DE TRABALHO'
Eu me referi ao fenômeno, dentro do contexto que eu estou descrevendo, que representam modos de resistir ou escapar da reunião com o desconhecido. 

Mas também há fenômenos que representam modos de ida para conhecer o desconhecido. E aqui nós estamos no território de atividade do grupo de trabalho. Eu suspeito que os praticantes de relações de grupo realmente não começaram a fazer mais que arranhar conceitualmente a superfície deste fenômeno, entretanto a prática pode ser feita com antecedência da teoria. É muito fácil abrigar tudo atrás da idéia crua, simples do grupo de trabalho como o grupo que se encontra para executar uma tarefa pública. 

A dificuldade está nos contextos que eu estou falando, ou, na reunião com o desconhecido, a própria tarefa pública pode ser problemática. Isto é por que eu penso que pode ser útil pensar em grupo de trabalho que não só funciona pelo conceito de tarefa pública e todos seus vários derivados, mas também pela idéia a que eu me referi no princípio, do grupo de trabalho como uma arena para transformações. Eu não quero reivindicar que esta ideia corresponde a uma realidade observável clara do funcionamento do grupo. Estou usando isto (no termo de Bion) como uma preconcepção para a qual uma realização pode ser encontrada que dará à luz a uma concepção.
Mas eu penso que a pessoa pode descobrir elementos de tal realidade no aparecimento de imagem, de sonhos, de mitos, dentro de um grupo e na capacidade para o que Barry Palmer e Colin Evans chamaram 'jogar sério'. Ou nesses momentos em um grupo, que pode estar mais presente nos grupos da vida cotidiana do que nos grupos temporários que criamos nas conferências de relações de grupo, quando as pessoas podem associar o material de outros sem uma preocupação irritável com a propriedade e sem o recurso para uma ideia prescritiva de 'relevância'. 

Recentemente, Gordon Lawrence buscou explorar esta área em uma série de conferências em 'Sonho Social'.  É interessante a mim que, descrevendo a atividade ele está tendo a intenção de emoldurar, Lawrence evita uso do termo 'grupo', preferindo falar de uma 'matriz', definida como um lugar 'fora da qual algo se desenvolve'. Parte da razão disto, mencionando novamente, pode derivar da sensação de Lawrence que as sociedades industriais avançadas estão experimentando mudanças cumulativas que podem ser interpretadas como o começo do fim dessas sociedades como elas foram conhecidas no passado e o começo de sociedades que podem ter que ser 'inventadas'. É como se, para criar a possibilidade de explorar aquele tema, a pessoa precisa inventar uma forma nova em troca para a exploração livre das associações que giram ao redor dos conceitos de 'grupo', ou 'grupo de trabalho' como estes tenham sido até então empregados. 

TRANSFORMAÇÕES EM INSTITUIÇÕES: A TENSÃO ESSENCIAL
A inovação de Lawrence, simultaneamente metodológica e institucional, ilustra, mas também evita uma última parte do pensamento de Bion a qual eu desejo comentar. Ao longo da sua vida, Bion teve uma suspeita profunda e desconfiança da vida institucional. Em vários dos seus mais recentes seminários ele se refere deste modo às instituições: "A dificuldade sobre todas as instituições, o Instituto Tavistock e todas que temos, é que elas estão mortas, mas as pessoas dentro delas não, e as pessoas crescem e algo vai acontecer. O que normalmente acontece é que as instituições (sociedades, nações, estados e assim sucessivamente) fazem leis. As leis originais constituem uma concha, e então novas leis ampliam aquela concha. Se fosse uma prisão material, você poderia esperar que as paredes da prisão fossem elásticas de algum modo. Se as organizações não fazem nada, elas desenvolvem uma concha dura, e então a expansão não pode acontecer porque a organização se prendeu." 

Organizações se prendem quando estão impossibilitadas de apreender a ideia nova: se vem de dentro ou de fora ou pelos poros da sensibilidade das pessoas para a presença do desconhecido. Mas nós podemos perder facilmente a visão do fato que qualquer ideia nova requer alguma anfitriã pela qual não só é disseminada, mas também é tornada disponível para o uso ao longo da comunidade ou sociedade ou grupo. Ideias são precárias: elas necessariamente não emergem completamente formadas ou são completamente compreendidas. Elas podem ser os produtos de gênio ou do flash de gênio que todos nós somos capazes em algum tempo. Elas precisam de assimilação, digestão, tradução e, às vezes, negócio doloroso, paciente de reflexão, teste, confirmação. 

Em Atenção e Interpretação Bion soletra um modelo de 'grupo institucionalizado de trabalho' como essencial para o desenvolvimento da ideia nova, o trabalho do gênio, o místico. Pelo aparecimento da função do Estabelecimento, e a elaboração consequente de regras, de treinamento e critérios para qualificação, o grupo de trabalho institucionalizado cria uma acomodação psicológica e emocional a ser feita à realidade que um gênio mata, um flash de gênio enfraquece. Esta função provê alguma proteção contra a onipotência e a tendência para confundir a ideia consigo mesma, como se a pessoa possuísse isto em lugar de realizá-la. 

O fato de que o trabalho do mundo tem que ser feito por pessoas ordinárias faz este trabalho de cientificação, ou vulgarização, ou simplificação, ou comunicação ou tudo junto, imperativo. Não há suficientes místicos para ir em volta e esses que há não devem ser desperdiçados. 

Se eu pudesse pôr este ponto de um modo mais mundano, está fora da tensão entre a ideia nova e seu recipiente: seja um grupo, uma organização, uma sociedade, uma mente individual (ou realmente uma palavra, ou uma forma de arte) que o desenvolvimento acontece, ou reciprocamente não acontece. Sem aquela tensão você produziria nada ou quando muito, ostentação.
Se as transformações criam resistências, elas também requerem isto. É a relação entre as duas que é produtiva ou destrutiva, não em si próprias. A tensão ou os paradoxos que eu tenho chamado de intrínsecas à toda a experiência em grupos e as suas formas institucionalizadas é uma 'tensão essencial'. E esta é a última área na qual eu penso que todos os que estão envolvidos em trabalhos de relações de grupo poderiam aprender algo do pensamento de Bion estando alerta à fenomenologia desta relação e para os sinais de sua presença. 

EM CONCLUSÃO
Quando eu tive a intenção de preparar esta conferência, eu pensei que eu soubesse o que eu queria dizer bem claramente. Eu tinha lido muito do trabalho de Bion, e vivi por muitos anos com isto. Eu tinha falado frequentemente sobre isto a meus colegas no Instituto e sentia que tinha experimentado vínculos entre isto e minha própria experiência e tinha praticado coordenando grupos e em trabalhos de consultoria e de pesquisa. 

Enfrentado com uma folha de papel em branco, minha mente assumiu aquela brancura, e eu me senti bastante assustado. Talvez o "imperador estivesse nu". Fui tentado (e não resisti a isto bastante) voltar inúmeras vezes para os textos, a bíblia de Bion, e beliscar qualquer roupa que eu achasse lá. Duas semanas antes um colega me perguntou qual seria o tema principal da conferência. Eu murmurei algo incoerente e me senti sendo perseguido.  Levou uma quantia irregular de tempo para ver que não havia 'nenhum casaco'. Se eu pudesse só me permitir não experimentar o "branco" como uma perseguição mas como um espaço no qual o pensamento já estava então talvez eu começasse a descobrir o que eu poderia dizer.  Talvez. 
Este estado de mente na presença do pensamento intocado, a coisa nenhuma que espera ser descoberta e formulada pela elaboração e jogada com o pré-verbal e imagens verbais, com sonhos, mitos, preconceitos, Bion se referiu e usou uma frase de John Keats em uma carta para seus dois irmãos, como 'capacidade negativa’: "Eu não tive uma disputa mas uma discussão com Dilke em vários assuntos; várias coisas encaixaram em minha mente e imediatamente me golpearam que a qualidade para formar a realização de um homem em Literatura na qual Shakespeare possuiu tão enormemente, eu significo como Capacidade Negativa que é quando um homem é capaz de ser em incertezas, mistérios, dúvidas sem qualquer irritação." 

Para a maioria de nós este estado da mente que Bion acreditava estava no coração da prática da percepção psicanalítica nos indivíduos e grupos, e é extraordinariamente difícil de alcançar. Mas sempre é tentador, até mesmo se nós tivermos que ficar contentes, geralmente, em andar nos passos de outros.