Este texto reflete a minha maneira de ver o funcionamento de um grupo.
Entendo que quanto mais claras estiverem as posições, quanto mais espaço de movimentação existir para os membros de um grupo e quanto mais nítidas as fronteiras, será maior a probabilidade deste grupo atingir seus objetivos com mais qualidade.
Ocupação
do espaço psicossocial: um olhar a partir de Kurt Lewin
Kurt Lewin, psicólogo alemão que é tido como um dos
maiores pensadores do século 20 criou a fórmula C = f(p,a) para
demonstrar o caráter dinâmico e a interligação entre a
pessoa e seu ambiente. Segundo
Lewin, o comportamento (c) é uma
resultante (f) do conjunto
de fatores que coexistem no momento, no ambiente (a) em que o
indivíduo (p) desenvolve
sua atividade: família, escola, trabalho, política, religião, etc. A este
conjunto de fatores chamou de campo psicológico, que constitui o espaço de vida
de um indivíduo e define a
forma como o indivíduo ou o grupo percebe e interpreta o ambiente externo que o
rodeia. O artigo pretende lançar um olhar, a
partir de Kurt Lewin, nas relações interpessoais e intragrupais.
Comecemos por definições que são básicas e
muito importantes:
Posição - lugar
que alguém ocupa em um grupo. A posição dá status a quem a ocupa. Pai, gerente,
esposa, mãe, filho mais novo, nora, professora, são posições.
Papel - refere-se à
forma como alguém desempenha uma ou mais posições: pai acolhedor, gerente
democrático, mãe acolhedora, professora boazinha. O papel qualifica a posição e
garante espaço no grupo.
As posições são estáticas, mas podemos exercer várias
delas. Por exemplo, no grupo familiar alguém pode estar na posição de marido e
pai. Em cada um dos grupos dos quais participamos temos uma posição, mesmo no
grupo de amigos nossa posição é amigo.
Os papéis são dinâmicos. É possível, num determinado
momento um pai ser autoritário e em outro momento o mesmo pai ser democrático.
Uma posição pode ser desempenhada através de vários papéis.
Espaço geográfico é o espaço de convivência de um grupo e
espaço psicológico é o espaço de vida de um grupo. Um não existe sem o outro.
Então vejamos: um homem, uma mulher... Encontram-se,
apaixonam-se e decidem morar juntos. Escolhem conviver num mesmo espaço
geográfico.
Esta decisão é o início da constituição de um grupo que
pode influenciar nas gerações futuras se vierem a existir.
Tanto o homem quanto a mulher levam para essa relação
suas histórias individuais na família, o funcionamento desse grupo de origem,
sua cultura, suas regras de comportamento e hábitos, dos mais simples até os
mais complexos.
A própria escolha do espaço físico que este casal ocupará
a partir do casamento, ou da decisão de viverem juntos, será resultado desta
negociação ou resultado de não ter havido negociação.
Culturalmente temos o ambiente doméstico como sendo
espaço da mulher. Cada vez mais, no entanto, está havendo mudanças neste
paradigma, pois o homem também começa a enxergar a casa como responsabilidade
sua. Como será a distribuição dos móveis? Que tipo de móveis? Hoje cada vez
mais vemos homens desempenhando funções culinárias. Isso influenciará na
decisão da organização da cozinha? Ou a parceira deste homem entende que o
território é dela? Ou ainda, os dois delegam o espaço somente para a
cozinheira?
O momento das refeições pode ser ilustrativo como um
palco, se o observarmos: qual lugar na mesa a ser ocupado? Homem na cabeceira?
Mulher à direita ou à esquerda? As refeições são feitas em frente à
televisão? Há um horário acordado para as refeições ou cada um faz a sua quando
chegar em casa? O momento da refeição é um momento agradável, de compartilhamento
ou é um momento sério de recolhimento? É falta grave não estar presente em uma
refeição?
Como isso se dá na família de origem do homem e na
família de origem da mulher? Há mais semelhanças ou mais diferenças?
Se não houver uma negociação a respeito destes temas e de
outros muitos, tanto o homem como a mulher entram no casamento levando
expectativas de que as coisas continuem como são e sempre foram. Se as
experiências de um e de outro não
tiverem sido muito diferentes, é possível que a negociação se dê em um clima
mais harmonioso, mas se há expectativas de que o modelo de um prevaleça sobre o
modelo de outro, os conflitos começarão a ter início.
Como é tomada a decisão sobre qual lado dormir na cama do
casal? É pela facilidade de acesso ao banheiro? É por uma imagem gravada
anteriormente sobre qual o lado em que o pai dormia e
qual o lado da mãe? É para ter mais espaço para o berço do nenê que chegou ou
está sendo esperado?
A construção e organização deste espaço físico e a
negociação sobre sua ocupação, está fazendo parte de uma contratação maior e
mais profunda que é a contratação do espaço psicológico. Isso determinará a
forma como cada um dos parceiros se movimentará na relação. Uma boa negociação
resultará numa boa parceria, às vezes complementar.
Não há dúvidas de
que, se a cultura da família do homem for “homem manda, mulher obedece” e, se a
cultura da família da mulher for “mulher obedece e homem manda” este casal tem
uma altíssima probabilidade de" ser feliz para sempre", apesar do
ressentimento da mulher. Também é possível
afirmar que ambos tenham se buscado, mesmo que
inconscientemente, para dar continuidade a esta cultura. É bem mais fácil, pois
cada um transitará em terreno já conhecido, o que quase não exigirá necessidade
de negociação. Já estavam “combinados” antes mesmo de se conhecerem.
No entanto, se estas diferenças culturais forem grandes,
quanto mais o casal disponibilizar tempo para o diálogo a respeito destas
diferenças, mais a construção do espaço psicológico estará contribuindo em
direção a mais liberdade.
Muitas diferenças podem existir e influenciar na
construção deste espaço geográfico / psicológico: a diferença de idade entre os
membros do casal, de formação educacional, de regiões geográficas, religiosa,
ideológica, etc.
É este pequeno grupo que criará ambientes relacionais que recepcionarão
os filhos no aprendizado da convivência em grupo.
Continuando... Então este casal decide engravidar ou, a
gravidez acontece. A partir do momento em que a mulher engravida, adquire uma
outra posição - a de mãe - que se soma a de esposa. Posição é poder,
portanto... ..
Muda a configuração existente até então. Ao mesmo tempo
começa a se desenhar uma nova posição de uma concretude imensa: o nenê, o / a
herdeiro (a), nosso filho, meu filho, teu filho, meu neto, meu sobrinho, meu
primo. Só o futuro pai (pois ainda não o é), continua sendo o marido da mãe
daquele poderoso ser que está sendo gestado.
Imaginemos que este casal tenha feito uma bela negociação
de seus espaços e contratado cláusulas de respeito, autonomia,
interdependência, acolhimento e valorização das diferenças. Nesta
relação a chegada do
filho representa a possibilidade de algo
muito bem vindo.
No entanto, a chegada de
mais um integrante da família nos espaços construídos pelo casal vai afetar o
espaço já existente. No que diz respeito ao espaço físico, é possível construir
um novo quarto. No espaço psicológico, não. Haverá necessidade de mais uma
negociação e agora entre três participantes. Mesmo que um não participe
diretamente, a negociação girará em torno dele que precisará ter garantido seu
espaço. Neste momento ao menos, ele não poderá perder espaço. Se a negociação
for bem feita, se o casal mantiver no seu funcionamento as cláusulas iniciais,
o espaço de movimentação livre continuará, a permissão para atuar em diversos
papéis existirá e a re-acomodação do espaço
psicológico se dará de novo de forma harmônica.
Vejamos por um outro lado. O pai, na gestação já não teve
a mesma atenção que tinha antes. Sua mulher agora não tem mais a disposição
física que tinha e vive a gravidez com todos os cuidados naturais necessários.
Não havendo por parte do marido esta compreensão, ele poderá se sentir
rejeitado, sentir ciúmes e querer demarcar mais ainda seu espaço, que sente
estar sendo usurpado pelo “invasor” que se aproxima. Quando ele chega e, às
vezes até toma o seu lugar na cama, é difícil não ficar irritado. Nessa
dimensão não e possível construir mais um quarto.
Essas são duas possibilidades de ambientes relacionais em
que pode chegar este novo membro do grupo.
Durante o período da gravidez acontecem grandes papos
entre mãe e filho, pai e filho e entre marido e mulher a respeito da forma como
educarão a criança, do que cada um espera que o filho seja, sobre o que farão
para que o filho cresça saudável, sobre os planos para que seja bem sucedido e
por ai afora. Desta forma estão construindo as possibilidades de papéis que
serão oferecidas ao novo membro para que ele tenha o seu espaço no grupo.
Como estes diálogos, na maioria das vezes acontecem num
clima amoroso, fica difícil aceitar que possa estar havendo algum tipo de
controle e o início da construção de uma fronteira psicológica que permite
espaço de movimentação de um outro ser na relação grupal, definido
antecipadamente.
Até aqui temos três membros deste novo pequeno grupo, que
faz parte de um outro grupo - o grupo composto pela família de origem do homem
- e de outro – composto pela família de origem da mulher.
Seria absurdo levantar a possibilidade de que a nova mãe
do novo integrante possa experimentar sentimentos contraditórios em relação a
sua própria mãe?
Se a relação mãe e filha não foi construída de uma forma
que permita autonomia, poderá haver por parte da filha / nova-mãe, uma
sensação de estar sendo invadida em seu espaço, ainda mais se a mãe tende a
assumir papéis que denotam “eu sei e você precisa aprender comigo”
Também seria absurdo levantarmos a possibilidade de que a
mãe do novo-pai teça críticas à forma como estão educando seu neto?
Como o novo pequeno grupo lidará com estas invasões?
Demarcarão limites? Que fronteiras definirão? Claras?(“a quem cabe e o que?”).
Rígidas? “na nossa casa não admitiremos opinião de ninguém”.
Continuemos nossa jornada. Segunda gravidez. Pai e filho
formam uma aliança para se proteger de mais um invasor para o pai e de um
usurpador de seu lugar para o filho. Mais uma posição terá que ser criada
naquele pequeno grupo e o mesmo espaço precisará ser redistribuído.
Como dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço
ao mesmo tempo, é claro que o segundo filho buscará o exercício de papéis
diferentes daqueles que o primeiro já desempenha, pois ter espaço neste grupo
lhe é vital. Aquelas
conversas que aconteceram quando da gravidez de seu irmão mais velho, também
acontecerão com ele, e é possível
que nelas lhe seja
dito o quanto gostariam que ele fosse diferente do irmão.
Novamente a cultura existente naquele pequeno grupo vai
determinar o tom desta negociação, tanto nessa nova família quanto no interior
do grande grupo familiar.
É neste pequeno / grande grupo que cada um de nós inicia
a aprendizagem de entrar e viver em grupo.
Os primeiros ambientes relacionais que nos influenciaram
na escolha de papéis e posições, vão nos acompanhar e continuar influenciando.
Muito do aprendizado pela vida afora é feito ressignificando nossas
relações engendradas nesses ambientes.
Ao sair para a vida o aprendizado da criança será feito
no exercício do quanto será possível desempenhar nos novos grupos, os papéis
que aprendeu a desempenhar no pequeno grupo familiar e a descobrir novos
papéis, que desvendem capacidades antes adormecidas enquanto buscava de todas
as formas garantir seu espaço na família.
Até aqui a família, nosso primeiro grupo, esteve no foco
de nosso olhar.
Além desse aprendizado, o candidato a ingressar em um
novo grupo lida com três situações:
Vimos que um grupo se organiza por meio de posições e
papéis. Essas posições e papéis como são pilares do grupo, pertencem ao grupo e
não aos indivíduos. Portanto, o ingresso no novo grupo se dará na configuração
de posições e papéis já existentes.
Se o grupo espera que eu desempenhe papéis que também são
desejados por mim, eu entrarei nesta estrutura sendo muito bem recebido e me
sentirei feliz. Se, de outra forma, o grupo espera que eu desempenhe papéis que
não são desejados por mim, minha permanência neste grupo vai depender do grau
de atração que o grupo exerce sobre mim. E há uma terceira possibilidade, que é
a de eu desempenhar papéis que não são desejados pelo grupo, mas por mim, o que
vai me colocar numa situação sujeito à rejeição ou boicote. Rejeição se eu
estiver numa posição de igual status, boicote se minha posição for de maior
status.
Para o grupo já existente será sempre mais desejado que o
novo integrante que venha substituir o que saiu - portanto mesma posição -
também desempenhe os mesmos papéis, com pequenas variações sendo admitidas.
Portanto, qualquer mudança pretendida na forma de um
grupo funcionar, inevitavelmente passa por um exame na estrutura de posições e
papéis, no desempenho e expectativas, na clareza e ressignificação, enfim, por
uma negociação de espaço e status.
Vejamos toda esta construção em outras manifestações
grupais.
Na escola.
Nos últimos 20 anos, a educação infantil, no Brasil e no
mundo, foi foco de profundas reflexões no campo da legislação, da investigação
pedagógica e das políticas públicas governamentais. No caso brasileiro a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, 1996), pela primeira vez prioriza
a educação infantil e os resultados já estão aí para serem comprovados.
Há uma preocupação e um investimento de tempo na recepção
e acolhimento das crianças que conviverão, no mínimo por um ano, com a mesma
professora e os mesmos coleguinhas. Há tempo para que os espaços de
movimentação sejam construídos e negociados. Uma boa professora trabalha em
conjunto com os pais quando identifica comportamentos que não estão ajudando a
criança no aprendizado de sua socialização e quando isso acontece, mais uma
oportunidade de facilitação de crescimento é oferecida ao aluno por seu
contexto.
Entretanto, há uma expressão ouvida no ambiente escolar e
familiar quando a criança sai da educação infantil e vai para o ensino
fundamental que diz assim: agora terminou a brincadeira. Infelizmente termina
mesmo e é o início de um período que mais contribui para o acúmulo de
informações e quase nada para a educação relacional.
Mesmo que a convivência se dê num mesmo espaço
geográfico, a alternância de professores dando pouca ou nenhuma importância ao
que está acontecendo no processo grupal, por não saber e não por descaso,
atuando mais como tarefeiros – dando aulas - faz com que até a absorção de
informações fique comprometida. Há uma
ocupação do mesmo espaço geográfico mas não há um compartilhamento deste
espaço. Se houvesse este compartilhar com certeza haveria troca de informações
a respeito dos grupos de alunos, a respeito do impacto que cada professor, com
seu estilo, provoca no grupo e o quanto este impacto está sendo educativo ou
não. Haveria um crescimento do sistema.
A dissociação entre os subsistemas que constituem a
escola - direção, corpo técnico, professores, corpo de apoio --, consequência
do não ter negociado seus espaços no sistema, contribui mais ainda para que o
ambiente, que deveria ser de acolhimento, apareça como estimulador da
competição, do individualismo, da segregação, do surgimento das tribos dos
iguais, que são organizadas muito mais para defesa de seus espaços do que por
identificação afetiva.
No ensino superior também não é diferente. A reforma do
ensino universitário na década de 70 foi muito bem recebida pelos professores,
pois não precisariam mais lidar com grupos. No sistema de créditos, cada aluno
conviveria com no máximo cinco colegas de forma mais próxima e dificilmente ao
mesmo tempo. Em sala de aula havia um aglomerado de alunos, um professor que
ditava informações e muito pouca relação.
É raro encontrar um currículo
escolar que reserve tempo para a integração entre os participantes deste
sistema: alunos e educadores (aí compreendidos todos os atores: direção, pais,
professores, técnicos, apoio, etc). O espaço
geográfico da escola é um excelente lugar para o encontro, ainda não
aproveitado em seu potencial e, ás vezes, dilapidado. Por que será?
Quantas vezes já se ouviu educadores
dizendo que este ou aquele grupo eram muito difíceis para trabalhar.
Existem grupos difíceis? Ou podem ser participantes que
convivem num espaço comum, durante um determinado tempo e que estão em
busca de uma forma de ocupar o seu lugar
de valor? Com fome de
ser significante naquele grupo?
Muitos conflitos entre escola e família acontecem em
razão deste choque. Famílias que buscaram acolher bem seus novos membros e os
ajudaram a construir espaços de movimentação, encontram dificuldades ao colocar
os filhos na escola onde as regras
são muito diferentes, e às vezes até contrárias às suas
expectativas. Esperam que o caminhar de seu filho na sua socialização seja
feito da forma mais progressiva possível e o que acontece é uma possibilidade
de retrocesso. Sim, possibilidade de retrocesso porque qualquer criança tem o
desejo de ser incluída e, se necessário, no ambiente da escola, assumirá
comportamentos que garantam a sua inclusão. Comportamentos que podem ser bem
diferentes daqueles esperados
por sua família.
Por outro lado, famílias que tiveram dificuldades na
construção de espaços relacionais que propiciem saúde, culpam a escola por esta
não conseguir que seus filhos assumam comportamentos que não puderam ser
desenvolvidos no ambiente familiar.
Não é possível o isolamento entre essas instituições. Os
dois sistemas precisam conversar entre si como aliados em seu saber e em seu
não saber. E, o mais importante, estes sistemas contribuirão para a educação de
crianças e jovens se experimentarem, além do conversar entre si, conversar
internamente, exercitando a tarefa complexa de negociar seus espaços
relacionais. Para isso precisa ser privilegiado um tempo e principalmente a
decisão de mudar. E vejo como primeiro passo o eliminar culpados.
Na empresa
Nas organizações também lidamos com a mesma estrutura de
posições e papéis. Talvez de uma forma mais objetiva, pois a questão da
autoridade está impressa na hierarquia institucional. Um gerente pode demitir
e/ou promover um funcionário.
Olhemos a posição de gerente. Esta é muitas vezes ocupada
por pessoas que, quando simples membros do grupo tinham um espaço de
movimentação no exercício de papéis de influência entre os parceiros. Quando
promovidos é comum que passem a desempenhar papéis esperados da posição de
gerente e deixem de ocupar o espaço da forma como faziam. Uma expressão que se
ouve dentro das organizações: um bom técnico não necessariamente será um bom
gestor. Quando o gestor passa a exercitar papéis desejados pelo grupo ou por
quem o promoveu, e não por ele, experimenta stress, perda da espontaneidade e
diminuição de sua capacidade de influenciar a equipe como o fazia antes da
promoção.
Quando o gerente vem de fora, há a expectativa com
relação a ele de que, para a mesma posição existem os mesmos papéis, ou seja, o
novo integrante deveria se encaixar no espaço já existente na organização.
Desta forma os membros do grupo não precisam reexaminar-se, redesenhar seus
papéis, mantendo a mesma estrutura já conhecida e, portanto, mais fácil de
lidar. Se este novo gestor resolve agir de forma diferente, precisará de muita
habilidade para trabalhar esta mudança. Habilidade e tempo, pois o movimento
comum esperado é o de resistência e às vezes até de boicote.
No sistema financeiro, até a alguns anos atrás, uma
estratégia utilizada para obter mudanças rápidas era a de demitir o gerente de
uma agência bancária e enviar um auditor autoritário, que fazia as mudanças
necessárias compulsoriamente até que um novo gerente fosse transferido. Quando
isso acontecia, este auditor ia para outra agência considerada problemática ou
voltava para a matriz, aguardando nova missão semelhante.
Quando falamos em desenvolvimento de equipe estamos
querendo dizer o que? O que mais se ouve é quanto a criar condições na equipe,
para que esta obtenha o maior ganho dos recursos de seus membros e consiga
melhores resultados, trabalhando de uma forma menos desgastante. É possível
promover desenvolvimento em uma equipe sem examinar sua estrutura de posições e
papéis? Acredito que não. Não se faz isso somente com a implantação de regras.
Considero que é necessário também examinar o quanto a liderança é validada pela
equipe, a forma como o espaço geográfico/psicológico está distribuído, o quanto
os papéis desempenhados por seus membros são aceitos pelos demais, e mais
tantos outros quantos.
O movimento mais significativo ainda hoje nas
organizações, para manter a situação de não mudança, está na atividade de
Seleção. O mais comum é procurar um candidato para o preenchimento de uma vaga,
com base nas competências necessárias para o cargo, mas principalmente, no
quanto mais facilmente ele se adaptará às regras de funcionamento do setor ao
qual pertence àquela vaga. Mesmo com competência técnica, se o candidato não
mostrar capacidade para desempenhar os papéis esperados pelo grupo, este pode
não aceitar sua inclusão e rejeitá-lo. O custo da demissão é muito alto para
arriscar nesta possibilidade e o processo se mantém.
Uma situação que chama atenção é a notícia de
que ocorrerá fusão de
empresas. Com certeza haverá produção de infelicidade em um número de pessoas
que até o momento da fusão eram valorizadas e sentiam-se pertencendo a um
grupo. De uma hora para a outra por mais que digam-se preparadas, pessoas são
excluídas, por não fazerem parte dos planos ou por serem consideradas
excedentes, sem o rito de passagem necessário.
Na Instituição Pública
De quatro em quatro anos nossas instituições públicas
experimentam uma situação que, por mais que seus participantes digam já estarem
acostumados, provoca desconforto, ansiedade, stress e muita expectativa. Ou
seja, o partido que ganha a eleição, municipal, estadual ou federal, ocupará as
posições de mando com pessoas que sejam membros do partido ou
simpatizantes.
As campanhas políticas acontecem em um clima emocional
que procura mostrar como cada partido é competente para mudar a situação atual
e como o partido que está no poder mostrou-se incompetente para fazer isso. A
mensagem é: “agora este município, este estado, este país será governado como
deve ser”. No caso do
partido que está no poder a mensagem é: nunca este município, estado ou país
foi tão bem governado e precisa continuar sendo.
Como a campanha é feita em cima dos erros dos então
ocupantes do poder, torna-se necessário mudar e, principalmente, mudar em cima
dos “erros” dos adversários, e quem trabalhava no governo anterior ajudou a
errar. Entendo que esta lógica burra, ainda resultado de uma campanha emocional
muito desgastante, é que está na origem de muitos problemas que dificultarão a
gestão das nossas instituições públicas.
Os servidores
públicos que estão fazendo seus trabalhos, orientados
por seus gestores. não deixam
de receber o rótulo de “incapazes e incompetentes” por parte daqueles que estão
chegando. E quem é
visto desta forma tem o seu trabalho questionado, independente do quanto já
tenha contribuído. Parece que contribuir com o governo do partido adversário
não é contribuir com a comunidade.
Um grupo que já tinha uma estrutura e uma dinâmica
de funcionamento vê as posições desta estrutura serem ocupadas por pessoas que,
na maioria das vezes, não pertencem à
instituição e um espaço de movimentação a ser reconstruído, ou seja, novos
papéis e novos ocupantes.
Se o clima de passagem de um governo para outro se desse
de uma forma menos traumática, acredito que o choque da “invasão” – é uma
invasão -, seria menos intenso pois poderia haver mais diálogo.
As instituições que mais cedo conseguem retomar este
diálogo e desfazer imagens de campanha, conseguem mais rápido começar a mostrar
resultados. O contrário vai fazer com que uma animosidade natural pela forma da
“chegada” acirre mais ainda os ânimos provocando o desejo de vingança.
Concluindo
Não é suficiente somente construirmos mais um quarto na
casa, modificarmos o organograma da empresa ou uma nova
descrição de cargos, termos professores altamente capacitados na atividade do
ensino ou elegermos partidos para o poder.
Em cada um destes ambientes precisamos exercitar nossa
capacidade de negociação, para compartilhar espaços físicos e psicológicos, da
forma mais saudável possível.
Tudo isso porque todos nós precisamos de um grupo para
viver. Somos tão gregários que mesmo sós carregamos um grupo dentro de nós.
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Mauro Nogueira de Oliveira
Abril/2009